O ceratocone é uma doença oftalmológica que afeta a córnea, que se localiza na parte da frente do olho, sendo responsável pela passagem da luz até retina. A condição se caracteriza pelo afinamento progressivo da córnea, que culmina na alteração de seu formato, que lembra a forma de um cone.
Segundo Dra. Junia Marques, oftalmologista e especialista em Córnea e Doenças Externas, Catarata e Cirurgia Refrativa, a alteração no formato da córnea é lenta e progressiva. Normalmente, é bilateral, ou seja, afeta os dois olhos. “No início, o ceratocone pode surgir em apenas um dos olhos. Mas, eventualmente, ambas as córneas serão afetadas. Outra particularidade do ceratocone é que seu desenvolvimento começa, normalmente, no final da infância e início da adolescência, ou ainda no início da vida adulta”, comenta.
O ceratocone pode afetar de 0,5% a 3% da população em geral. No Brasil, a estimativa da prevalência é de 1 a 2%. Dados do Ministério da Saúde apontam que surgem 150 mil novos casos da doença por ano, normalmente em pessoas entre 10 e 25 anos.
Quais são as causas do ceratocone?
Existem algumas hipóteses sobre a origem do ceratocone, entre elas fatores genéticos e ambientais. Há vários estudos que identificaram alguns genes associados à doença. Contudo, mesmo possuindo o gene, o desenvolvimento da condição está relacionado a alguns fatores ambientais.
Um dos fatores de risco mais comuns são as alergias. Estima-se que um terço das pessoas que desenvolvem o ceratocone são alérgicas.
“A alergia ocular leva à pessoa a coçar demais os olhos, por tempo prolongado. Essa fricção constante pode enfraquecer o tecido corneano. Ao longo do tempo, esse hábito pode resultar na deformidade da córnea”, explica Dra. Junia.
Outra linha de investigação, que tem ganhado força nos últimos anos, são defeitos na estrutura do colágeno, tecido que constitui a maior parte da córnea. O ceratocone também pode ser hereditário, mas é menos frequente. Por fim, existem algumas doenças genéticas que podem aumentar o risco de desenvolver o ceratocone, como amaurose congênita de Leber, retinite pigmentosa, síndrome de Down, Marfan ou Ehlers-Danlos.
Mudanças constantes de grau é um dos principais indícios do ceratocone
Apesar do ceratocone ser uma doença de progressão lenta, existem alguns sinais que podem indicar a sua presença, nas fases iniciais. “Uma das manifestações é a necessidade de trocar os óculos de forma constante, bem como a intolerância ao uso de lentes de contato. A visão pode se tornar mais turva e distorcida”, comenta Dra. Junia.
Outro importante fator de risco é o astigmatismo irregular, que se caracteriza pelo aumento do grau em um curto espaço de tempo.
Conforme a doença avança, ocorre uma diminuição importante da acuidade visual, bem como o paciente pode apresentar sensibilidade à luz, cansaço visual, coceira ocular, irritação e desconforto nos olhos. Nas fases mais severas do ceratocone, podem surgir ainda visão dupla, percepção de várias imagens de um mesmo objeto (poliopia), bem como feixes de luz e distorção dos reflexos em volta da luz.
Diagnóstico do ceratocone
Os cuidados com a visão devem começar ainda na primeira infância, com visitas regulares ao oftalmologista. “As crianças e adolescentes com alto grau de astigmatismo, miopia, com casos de ceratocone na família ou ainda com outros fatores de risco, como síndromes genéticas, devem ser monitoradas com mais frequência e de forma mais precoce”, aponta a especialista.
O diagnóstico depende da avaliação clínica, bem como de alguns exames oftalmológicos, como a Topografia de Córnea, Paquimetria (mede a espessura da córnea), Aberrometria (avalia possíveis distorções sofridas pela luz ao entrar no olho) e Microscopia Especular da Córnea (avaliação em detalhes da córnea, com medição qualitativa e quantitativa das células do endotélio (camada mais profunda do tecido corneano).
Principais tratamentos para o ceratocone
Nos estágios iniciais, o tratamento consiste na prescrição de óculos ou de lentes de contato específicas para quem tem ceratocone. As lentes são produzidas de forma personalizada, para se adequar ao formato da córnea do paciente.
Existem alguns procedimentos que podem impedir a deformação mais acentuada da córnea, como o crosslinking. “Este é um procedimento minimamente invasivo, em que aplicamos nos olhos do paciente a riboflavina, um dos tipos de vitamina B. Em seguida, usamos um feixe de luz ultravioleta para que a riboflavina se ligue ao colágeno da córnea. Com isso, conseguimos fortalecer o tecido corneano e impedir uma deformidade mais acentuada”, conta Dra. Junia.
Implante de anel corneano
O implante de anel corneano, também chamado de anel de Ferrara, é um dos tratamentos mais promissores para o ceratocone. O implante é indicado para os pacientes que apresentam alteração no formato da córnea, para melhor adaptação de óculos ou lentes de contato.
Transplante de córnea e ceratocone
O ceratocone é a principal indicação para o transplante de córnea, embora seja o último recurso no tratamento da doença. A maioria dos pacientes responde bem ao tratamento com lentes de contato especiais, procedimentos como crosslinking e implante de anel corneano.
Conclusão
O ceratocone é uma doença pouco prevalente na população em geral. Contudo, as deformidades na córnea surgem na juventude e prejudicam, além da visão, a vida acadêmica, profissional e social.
“Dessa forma, na presença de fatores de risco, bem como de histórico familiar da doença, a recomendação é procurar o oftalmologista o quanto antes. Caso o diagnóstico seja confirmado, o acompanhamento precisa ser constante para impedir a progressão do ceratocone”, finaliza Dra. Junia.
Dra. Junia Marques é médica Oftalmologista, especialista em Córnea e Doenças Externas, Catarata e Cirurgia Refrativa.